2005 – Bizz

Revista BIZZ – Edição 196, dezembro de 2005

As aparências enganam…
O que você faria se 1 milhão de fãs e outra multidão de desconfiados construíssem uma personalidade diversa de você mesmo?
Maria Rita fez o seguinte: sentou-se em seu bar favorito, pediu um chope, lula à dorê e nos contou sua biografia (até hoje) não-autorizada
Texto: Emerson Gasperin / Fotografias:Marcos Hermes

Em um desses arroubos de quem bebe, fala palavrão e se exalta – tipo todo mundo- ela estica o braço e deixa escapar o ideograma no pulso esquerdo.
Pergunto o que significa. ”Luz”, responde. Sentada a minha frente , Maria Rita contraria a imagem que a gravadora, a imprensa, os amigos e ela própria alimentam sobre Maria Rita. Como essa garota pode ser a mesma ”cantora que não da uma declaração sem estar cercada de assessores”? A mesma ”menina tímida cujo talento foi mantido em segredo por esses anos todos”?
Ela parece tão… a vontade. Tanto que, só para sacanear, duvido da explicação para o significado da tatuagem.
Alego que pode ser qualquer coisa que o tatuador tenha inventado. Espero um sorriso de retribuição, um olhar aquiescente; tudo menos uma mina que entre no espírito e emende, aos risos:”É! como a piada do bebum que foi fazer uma tatoo e o tatuador desenhou um p** enorme nas costas dele!”.
Estamos em uma mesa no canto à direita da entrada do Genésio, na Vila Madalena, em São Paulo. Maria Rita sente-se em casa. O bar pertence à Helton Altman, que empresaria a carreira da cantora. Ocorreu aqui a festa que comemorou o lançamento de seu primeiro disco, em 9 de setembro de 2003, mesmo dia em que completava 26 anos. Nessa idade, sua mãe, Elis Regina, com quem sempre será comparada, já tinha quase 20 LPs no currículo e nem um décimo do aparato promocional da filha. A estratégia do ”produto Maria Rita” chegou ao paroxismo quando incluiu, no kit distribuído a imprensa, um mp3 player iPod carregado com as músicas do disco Segundo. Encarado como tentativa de suborno, o mimo de 600 paus foi denunciado, condenado, esconjurado e, às vezes, devolvido. A ação (e seus desdobramentos) acabou sendo mais comentada do que aquilo que se propunha a divulgar.
Para não parecer provocação, prefiro não usar o gravador digital, facilmente confundível com um iPod a luz fraca do recinto. (Bem, nunca falei com Maria Rita antes; vai que ela se ofenda e invalide os dez dias desde que Altman foi procurado para convencê-la de dar uma entrevista para a revista BIZZ. Soa óbvio, a cantora nas paginas da revista de música. Mas com Maria Rita nada é…)
”Tomei rasteiras, sustos, fiquei triste … Hoje, tô me protegendo da melhor maneira possível. Se amanhã não for mais essa, a gente aprende de novo”, diz ela , entre um chope, e uma porção de bolinho de carne e o empresário, sentado a sua esquerda. Também estou acompanhado.
Pelo editor, Ricardo Alexandre, que me cutuca por baixo da mesa para eu parar de falar sobre bebes com ela – Maria Rita, naturalmente, já aplicara a shantala em Antonio, de 1 ano e 4 meses – e ligar o cassete de uma vez.
”Tem um fff…(pede desculpas e retoma), tem um ser humano que escreve uma matéria e não assina a p**** da matéria. E isso e uma falta de respeito com o leitor! A imprensa são pessoas. Então, tem alguém responsável pelas merdas que saem na imprensa, sim! A palavra tem um poder muito forte, especialmente a imprensa. ‘Eu li’ é quase como se tivesse visto. Com esse poder, uma coisa é você falar que caiu uma árvore ali na (avenida) 9 de julho e provocou um transito terrível. Outra é falar da vida de alguém. Brincar com a índole e o caráter de uma pessoa.
Levantar minha mãe pra me derrubar?(enjoada) Que feio! Família é coisa muito sagrada. É muito feio quando se metem nisso”.
Maria Rita supõe que a treta tenha surgido por não ter cedido entrevistas exclusivas – como esta, que você está lendo – aos representantes da imprensa que agora a desancam. ”Ficou tão na cara que era um desconforto comigo…”, acredita.”Talvez porque um dia eu tenha dito: ‘Não, não vou dar pra você mais do que eu dou pro resto’; talvez porque eu tenha sido democrática nas minhas decisões.” Democrática e pragmática; ela sabe que, no obtuso jornalismo cultural brasileiro, o artista do primeiro escalão que fala com exclusividade a determinado jornal ou revista fica ”queimado” nos veículos concorrentes, que ou o ignoram ou partem para a ignorância. Um risco que Maria Rita não podia correr.
Não depois de protagonizar uma das maiores campanhas de lançamento já feita para um artista brasileiro, quanto mais para uma estreante.

Plano
O grande lance do plano foi, mesmo sem um sucesso tocando no radio, gerar uma curiosidade enorme a respeito da cantora. ”Na verdade existia um anuncio, aquele dizia: ‘A partir de hoje e para sempre’, um comercialzinho de televisão”, minimiza Washington Olivetto, da W/Brasil, que assinou as peças. Para o publicitário, velho amigo da família Mariano, o ”talento de Maria Rita é que ajudava, principalmente porque a industria fonográfica tem pouco dinheiro para propaganda no sentido convencional”. Nesse ou em outro sentido, a estimativa do mercado (espalhada pela imprensa da época)foi que a WEA teria gasto 1 milhão de reais para promover a artista . ”O aporte de investimentos foi evoluindo com as vendas”, afirma o diretor de marketing da gravadora, Marcelo Maia, sem confirmar valores.
Deve ter sido uma loucura. Segundo o executivo, a expectativa inicial era atingir 30 mil copias. Em agosto de 2003, pulou para 60 mil. No lançamento, já era de 100 mil, tiragem que Maria Rita só foi descobrir no seu aniversario, no Genésio. Qualquer quantia era factível com tanta exposição – e nem se está falando do ”comercialzinho”. No Fantástico, Maria Rita emplacou entrevista e clipe de ”A Festa”. O Jornal Nacional foi encerrado com trechos de uma apresentação no Rio. Em outro domingo, um especial extraído do DVD que chegaria as lojas no mês seguinte foi exibido logo após o ”Show da Vida”. O disco da ”Cantora que todo mundo estava esperando”(outro slogan) levou seis dias para alcançar o número projetado. Foi o quinto mais vendido daquele ano, a frente de Bruno & Marrone, Charlie Bronw Jr, Jota Quest e Leonardo – o campeão foi a trilha sonora de Mulheres Apaixonadas, novela que antecedeu Senhora do Destino, que manteve Maria Rita em evidência, graças a musica de abertura,” Encontros e Despedidas”.
”Quando me perguntaram se eu era mesmo a voz que todo mundo esperava, respondi:’Sei lá, pergunta pra quem estava esperando!. A gente tem que escolher nossas batalhas no dia-a-dia. Todo mundo sabe o que saiu, mas ninguém imagina o que deixou de sair. As broncas, as brigas, os argumentos, as discussões, ninguém sabe – e nem precisa saber. Não vou me fazer e me provar pelo que quero. Agora, se a gravadora faz marketing pra lançar o (creme dentel) Sorriso, e a Perdigão pra lançar a salsicha,é trabalho deles.
É um dilema que todo artista vive: eu sou um produto, só que eu sou um produto que sente, que dorme, que sua, que faz cocô, que chora…”
A estratégia não abrangia somente TV ou a presença maciça nos pontos-de-venda.
Na outra ponta do processo, a imprensa fez exatamente o que a WEA programou. No seu legitimo direito e interesse, a gravadora agendou entrevistas com Maria Rita para que fossem publicadas no mesmo dia, sem que um jornal ”furasse” o outro. Funcionou: em 10 de setembro, a cantora estava em todos os cadernos de variedades. As entrevistas marcaram também a forma com que a artista se relacionaria com a imprensa. Uma equipe de dez pessoas (gente da gravadora, gente de Maria Rita) testemunhou a coletiva com os jornalistas, sempre alerta para evitar maiores transtornos à estrela. ”A presença de diretor artístico, empresário e assessores é procedimento da companhia. É assim que nos fazemos com todos os nossos top artists, como Maria Rita e O Rappa”, justifica Maia.
Ao mesmo tempo que mirava o consumo de massa, o disco tirava onda de moderno, oferecendo duas musicas em um site cujo endereço a WEA informava só a quem o comprava. Ou seja, a milhares de pessoas que conheciam outras milhares. Claro que, no mesmo dia em que o álbum começou a ser vendido, ”Estrela Estrela” e ”Vero” foram descobertas por qualquer um com computador ligado a internet. Satisfeito, Maia disse a Folha de S.Paulo que a repercussão havia sido tão grande que a senha de exclusividade para compradores do CD teve de ser suspensa. ”Puro Marketing!”, comemorava.
A tabelinha entre Maria Rita e tecnologia continuou em Segundo. Desta vez, ninguém comemorou. Olivetto lembra do diretor de marketing da WEA revelando a ele suas idéias. ”Maia estava empolgado porque ia mandar o disco para os jornalista em um iPod, daria uma cara bem moderna”, recorda.”Jamais me passou pela cabeça outra leitura, até porque recebo semanalmente kits promocionais bem mais caros do que isso”, garante, assustado com a dimensão que imbróglio adquiriu.
”Achei isso mal-entendido maluquérrimo.” Questionado, Maia alega que já disse o que tinha para dizer e que a companhia considera o assunto encerrado.
Olivetto ressalta que ”Maria Rita tem uma personalidade muito forte, só faz o que quer”.”Ela sabia muito bem o que queria da vida dela. E está colhendo o resultado”, observa. A polemica do iPod tisnou uma reputação já manchada por detalhes e lendas urbanas do jornalismo pop como ”um assessor que traz o café já mexido para ela” ou ” um funcionário que entrou numa extensão durante uma entrevista por telefone para pedir que o repórter falasse mais sobre o DVD dela”. Se, no universo do marketing, você não é o que é e sim o que as pessoas acham que você é, Maria Rita acabou numa enrascada.
Para os detratores, ela é uma mala. Para seu publico, é a pobrezinha que merece solidariedade. E, para quem não se encaixa em nenhuma das facções, ela, seus fãs, a gravadora, a imprensa e a MPB são tudo um bando de frescos.
”Não quero que ninguém fique com bode de mim por causa disso.Eu sou parceira, não vou f**** quem trabalha comigo. Não vou sentar para uma entrevista e falar mal da minha gravadora, seria hipocrisia.Tem muita coisa que é culpa da gravadora, mas repito: ninguém sabe o que deixou de sair, o que acontece à portas fechadas, quantos tapas na mesa tem de rolar, quanto grito na orelha.
Trabalhei pra cacete pra chegar a esse ponto! Com o deslanchar estrondoso que rolou, mais minha gravidez, eu tive de deixar muita coisa de lado, tive mesmo. Tanto meu empresário quanto minha gravadora opinam na minha carreira. Opinam: quem decide sou eu. Aí chega um jornalista e fala que tudo é uma grande mentira? Teve até quem questionava porque eu tava na WEA, uma gravadora que teve litígio com Elis. Ora, a carreira é minha, não dela!”

Light
Maria Rita pede uma Pepsi Light Lemon. ”Senão daqui a pouco vou falar bobagem, e isso não vai ser bom”, explica. Ah, que nada! Bebe mais um copinho aí, mina!
Bebe e pára de fazer doce para contar que coisas tão especiais eram essas que deIxaram de sair. Ela diz que vai contar uma. ”Ofereceram 1 milhão e meio pra eu fazer uma campanha de um banco. Quatro comerciais de TV,30 segundos cada. Seria eu cantando e (lembra das duas canções da internet?) essas duas canções encartadas em 500 mil cópias de uma revista nacional. Só nessa eu já ganharia alguns Discos de Platina. Recusei. Não havia por que fazer além do dinheiro, e eu não faço por dinheiro.”
A cantora jura que não foi a grana nem a distribuição mundial que a convenceram a se decidir assinar com a WEA, em janeiro de 2003. ”Todas me ofereciam as mesmas condições”, assegura. A razão chamava-se Tom Capone, então diretor artístico da gravadora.
No segundo encontro com o produtor, no Rio de Janeiro, Maria Rita identificou no curitibano uma qualidade que, para ela, seria determinante. ”O termo diretor artístico, já é um conflito: diretor, que é um negócio burocrático, com artístico, que é só alma. E o Tom sabia até que ponto era diretor e a partir de que ponto podia ser artístico”, diz. Ela abriu o coração. ”Contei minha história, que eu só canto com alma, que choro no show, que tô pouco me f****** pro glamour”, emociona-se – e aí é impossível afirmar se as lágrimas são pelo desabafo ou pela lembrança do amigo. Capone morreu em um acidente de moto em Los Angeles, onde estava com Maria Rita para concorrer ao Grammy Latino, vencido por ela como Revelação do Ano, Melhor Álbum de MPB e Melhor Música Brasileira (”A Festa”). ”Ele disse: Ç******! Você sabe o que quer, hein?”. Em seguida, a convidou para ouvir Pietá, disco de Milton Nascimento do qual ela participa.
O primeiro contato com Capone foi no Supremo Musical, casa paulistana na qual Maria Rita fez sua estréia profissional no dia 2 de maio de 2002, uma segunda-feira. Na quarta, a capa do Estadão Derramava-se: ”Um canto deslumbrante. É a filha de Elis”. Ótimo – Não fosse aquele um show do violonista e compositor Chico Pinheiro, segundo lugar do Premio Visa 2000. O músico a conhecera nas gravações de Intuição, do cantor Pedro Mariano, em que ela trabalhava na produção. O convite para subi ao palco como integrante de um projeto serviu para diminuir certas dúvidas – e não era sobre o inglês da cantora, perfeito em ”April Child”, de Moacir Santos. Maria Rita que se preparasse para o que viria.
”Eu não tinha produtor nem nada, de repente ligava um programa de TV atrás de mim. Eu tava fazendo de tudo pra não virar o foco. Era uma das cantoras em um show de um violonista e compositor alternativo se apresentando para 80 pessoas! Não tinha como virar mega! Era uma guerra, acho que cheguei a me queimar com algumas pessoas da imprensa porque me recusava a dar entrevista. O projeto não era meu, pô! Aí eu gravei no disco Meia-Noite Meio-Dia (de Pinheiro, de abril de 200) e chegou um momento em que não agüentei mais. Não porque quisesse deixar de ser coadjuvante – pelo contrário, me colocaram na frente e aquilo não tava fazendo bem nem pra mim nem pra ele. E eu sentia a necessidade de cantar as mensagens que eu queria passar. Era o bichinho.”

O Bichinho
O destino manifestava-se na forma de sonhos, sinais, coincidências. Aos 16 anos, estagiária de produção da revista Capricho, Maria Rita leu o livro Cartas a um Jovem Poeta, de Rainer Maria Rilke. Um jovem, indeciso entre a poesia e a carreira militar, manda seus poemas para ser avaliados. O escritor checo aconselha de volta: ”Procure entrar em si mesmo. Investigue o motivo que o manda escrever; examine se estende suas raízes pelos recantos mais profundos de sua alma; confesses a si mesmo: morreria, se lhe fosse vedado escrever?(…) Se for afirmativa, então construa sua vida de acordo com essa necessidade”. Aquilo calou fundo na adolescente. Em 1993, assistindo ao despretensioso Mudança de Hábito 2, a personagem de Lauryn Hill vive um dilema. A protagonista Woopi Goldberg tenta ajudar, dando um livro à moça.Sim esses livro mesmo! Ela decide enfrentar tudo para ser cantora. Seu nome é Rita.
Cantar não era toda essa questão existencial quando se mudara para os Estados Unidos, em 1994, para morar com o pai, o pianista e compositor César Camargo Mariano. No segundo ano colegial, rolou uma concurso de calouros no prédio em que morava. Um colega a inscreveu. ”No dia, fugi. Quando me acharam, eu disse:’Vocês não têm noção de quanto isso é importante para mim”, lembra Maria Rita, enquanto pede a Altman que lhe indique algo para comer. ”Só me vinha uma música, ‘Velha Roupa Colorida’, porque tinha versos em inglês”, entrega. ”Fui, cantei, subi pro apê e tirei meu sapato. Tremia.” Lá em baixo, o prêmio já tinha dona. No sotaque do mestre-de-cerimônia, ”Rira Merienôu”.
A vencedora gastou os 50 dólares do vale-presente na Tower Recors e se aposentou. Foi cursar comunicações sociais e estudos latino-americanos na New York University. Mas o Bbichinho voltaria. ”Acordei de madrugada, liguei para o meu namorado e só conseguia balbuciar: “Meu lugar no mundo!”, lembra Maria Rita.
”Epifania pra c****** Minha Vida é cheia dessas coisas!”, assusta-se. A futura cantora terminou o namoro e embarcou para São Paulo em 200. Em fevereiro do ano seguinte, um CD-demo com quatro músicas cantadas por ela animou um churrasco na casa do jornalista e produtor Walter Silva, o Pica-Pau, que trabalhava com Elis Regina.
”A Filha de Elis canta. Divinamente”. trombeteou o Jornal da Tarde no dia 20 daquele mês.
”E a matéria ainda encerava com ‘Resta saber até quando será possível esconder Maria Rita’. Não tinha jogo de esconder nenhum! Ninguém da minha família sabia o que falar porque ninguém da minha família sabia que isso existia. Foi uma bomba, muito desagradável. Não tinha pressão, tipo ‘você não pode cantar’, isso é a maiormentira.
Enquanto eu estivesse feliz, pagando minhas contas e com um sorriso na cara, meu pai estaria feliz, fosse eu o que fosse. O ‘Experimento'(como se refere ao demo) foi uma boa engatinhada, porque me senti muito bem no estúdio, mas não era pra ter vazado. Nem eu tinha uma cópia.”
Sérgio Campanelli, da MCR, uma produtora de áudio som 28 anos de mercado, guarda o disco até hoje. À guisa de capa, um guardanapo com a pergunta ”Eu tenho bom gosto, né?” à mão. Assinado:Maria Rita. Durante três meses, ela experimentou timbres, afinações e abordagens no estúdio nos fundos de um antigo casarão no bairro do Bexiga, o mesmo no qual seu pai havia feito vários trabalhos para publicidade. Com voz e violão, gravou ”Vero” (de Natan Marques, guitarrista de Elis, e Murilo Antunes) e ”Dom Quixote” (de Lula Barbosa). ”Ela chorando de uma lado, o Lula de outro e eu fazendo micagem para ela não parar de cantar”, recorda Campanelli. Com orquestra de metais, testou ”Não Vale a Pena”, dos irmãos Jean e Paulo Garfunkel (que regravaria no primeiro CD).

Ganchos
Um belo dia, Maria Rita não apareceu.
Assim como chegou, foi embora.
”Só sei que aquilo não foi um delírio porque meu nome está na lista de agradecimentos do primeiro disco”, exagera ”Campa”. Ela retornara a Nova York, para trabalhar no departamento de relações publicas da WEA. Sua função consistia em separar por artista o clipping (cópias de matérias publicadas nos jornais) da gravadora. Em novembro de 2001, voltou definitivamente ao Brasil, para trabalhar com o mano Pedro. O tempo passou, Maria Rita aceitou seu carma, veio o Supremo, veio Pietá e deflagrou um verdadeiro leilão pelo seu passe. No final, a rinha polarizou em duas concorrentes. Uma multinacional. Outra, dirigida por seu meio-irmão João Marcello Boscoli.
Ele dirige a Trama, a única que podia arrancá-la da WEA. ”Eu cobriria qualquer oferta para ela assinas com a gente, mas aí entra outra coisa: a Rita não funciona por grana”, explica Boscoli. ”Dinheiro, pra ela, é apenas papel pintado”. Se fosse a irmã, Boscoli garante que nunca assinaria com uma grande gravadora porque ”seria melhor para a história do Brasil, da MPB, uma artista como ela assinar com um selo independente”. Na opinião dele, do contrário Maria Rita estaria ”dormindo com o inimigo”. Os dois mantêm um relacionamento fraternal-padrão, o que implica visitas (mais freqüentes depois que o sobrinho nasceu) e tabus (ambos não conversam sobre seus discos). Boscoli tem sua teoria sobre por que Maria Rita pendeu para a multinacional: ”Para ter distância da família. Não ser da gravadora do irmão seria um obstáculo a menos para uma artista que toda hora tem de responder sobre sua mãe”. Na mosca.
”Minha maior preocupação foram os ganchos”,explica ela. ”Daí porque demorar tanto para gravar disco, para assinar. Não queria que ninguém tivesse pretexto para falar de mim. Seria um descrédito tremendo! Eu tinha acabado de chegar ao Brasil e só ouvia nego reclamando dos filhos de artista que estavam se lançando. As escolhas feitas naquele momento as necessárias para a minha sobrevivência a para a minha sanidade mental. Eu seria devorada.”
Não foi. E se transformou em uma cantora poderosa, com liberdade artística prevista em contato. Sua estréia vendeu 800 mil unidades em 32 países (700 mil no Brasil). Segundo há quatro meses na praça, contabiliza 300 mil cópias em mais de 40 países (no exterior, já passou dos 100 mil). ”É legal, mas eu sou somente uma! Tenho um filho para criar, uma turnê para tocar e minha prioridade é o mercado nacional”, apavora-se a mãe de Antonio, fruto de um rápido romance com o diretor de seu DVD, Marcus Vinícius Baldini. A virginiana com ascendente em Áries e lua em Leão está cada vez mais relaxada com a sombra de Elis Regina, que morreu quando ela tinha 4 anos. Condicionou-se a se comportar como filha, curadora ou crítica, conforme a situação requeresse.
Nem o fato de transitar pela mesma faixa de público que a mãe tira seu sono. ”Se eu cantasse rock como a Pitty, iam falar que eu grito, que eu corro de um lado pro outro do palco como Elis Fazia”, arrisca ela, comendo mais um pedaço de lula a dorê antes de se despedir. Aos 28 anos, a caçula em nada se assemelha àquela menina que caminhava até o colégio Pueri Domus sendo zoada por João Marcello e Pedro aos gritos de ”turtle, turtle”, por causa da imensa mochila que carregava nas costas.
”Ela era tão quietinha que me surpreendi quando vi que tinha virado artista”, confirma a professora Àli (Alida Tulio Muller), que deu aulas de história para Maria Rita na quinta e na sexta séries. Devia ver sua ex-aluna agora, uma estrela que se desvia da saída do bar para atender uma mesa que pediu autógrafo. Estrela que volta e se reclina até o fã – essa eu nunca tinha visto.

  1. 13 de julho de 2012 às 6:36 pm

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